Aos meus Pais, Maria Helena e
Eduardo Roseira
um
dia, sem bater à porta, aconteceu a visita da saudade…
a casa
ficou com mãos de nada…
as paredes,
vestiram-se de nudez…
o ranger
da porta deixou de cantar…
de tristeza,
as molduras, ficaram vazias…
as cortinas,
outrora bordeaux, viraram cor da palidez…
o gato,
esse, deixou de connosco falar…
as paredes,
nuas…frias…
os móveis
prontos a partir…
o silêncio
das noites, invadiu os dias nesta casa solidão…
por detrás
dos armários, as teias, agora são rugas…
o que
antes falava da história da casa, é agora velha tralha…
as prateleiras,
plenas de cultura, estão ocas…nuas…
o tapete,
primeira serventia da casa, já só atrapalha…
num canto,
esquecida, uma jarra de rosas murchas, solta um lamento…
do velho
relógio, ainda na parede, o cuco já não sorri…
é a
invasão da tristeza em lume brando e tempo lento…
o piano,
agora desafinado, em desafio toca um dó, em lugar dum si…
a ferrugenta
gaiola de vazia, emudeceu…
num constante
martelar a saudade, apenas o “ping…pang…ping…pang…”
da
torneira do lavatório, como que reclamando o seu eterno adiado arranjar…
perdido
neste silêncio, ecoa um fado saudade,
tocado no avariado gira-discos …
colado
na parede do escritório, o amarelecido mapa…da geografia da vida,
já
não nos seduz para qualquer destino…
a carunchosa
credência, junto à entrada, aguarda a chegada do lixeiro,
e ironicamente,
na sua gaveta conserva uma velha cautela que a vida não premiou…
...eis
a história do dia em que dentro da casa a saudade se instalou…
Eduardo Roseira